Saturday, January 16, 2010

Doce melancolia

ultimamente só chove.
chove lá fora, puxo os estores ao máximo e fico à beirinha da minha ampla janela a contemplar o dia cinzento que se faz sentir.
vejo pessoas apressadas sem chapéu, pessoas calmas tão seguras da sua protecção como de si e vejo, invejo, roo-me em vergonha de pessoas calmas, um pé diante de outro numa dança ritmada e amorosa, apreciam a chuva nas suas pestanas, que lhes acaricia a face, beija os lábios, os abraça num apertado e longo abraço.
invejo...
o abraço que sinto, dentro de mim, é um apertar frio, gélido e cortante, que me faz arrepiar atrás do pescoço, que me faz vestir outro casaco, que me aperta mais e mais...
um abraço de dor eterno que me consome como uma combustão lenta e fugaz que me retira o oxigénio, que me retira o calor.
viro as costas à minha janela.
ainda não está na hora de ir lá para fora.

asterisco

Thursday, October 8, 2009

de meia volta

os dias passaram como uma brisa leve e quente de verão e a uma velocidade quase imperceptível.
o verão acabou e com ele levou a leve brisa que me arrastava juntamente com os dias da minha vida por este infinito de acontecimentos...
o inverno aparece escondido pelo outono, tímido, a deixar a vontade crescer.

no inverno os dias são pequenos, de noites muito longas, demoram a passar, e apesar dos fortes ventos que se fazem sentir, nada os demove e permanecem firmes perante um vendaval que só os quer empurrar para outro lugar! para bem longe!
as estações passam, vêm uma depois da outra com uma subtileza demais...

ainda não chegou e já quero que o inverno se vá embora... quero que me leve com ele!

Monday, May 4, 2009

xiu...

os dias passam, a preguiça, a moleza, a simplicidade e revolução que é existir, vão-se apoderando das poucas palavras que ainda divagam nos meus pensamentos. Deixam-me nua, despida, parece que nada mais há a dizer... as palavras especiais foram-me roubadas pela minha própria vida!

num outro dia num sussurro quase imperceptível contavam-me que as palavras vêm dos nossos corpos... uma linguagem individual e indescritível, o meu corpo grita num silêncio pesado mil e uma palavras que não sei se alguém as ouve.

Sunday, January 18, 2009

o som da chuva a cair...

não há nada de grandioso a correr pelas minhas veias de pseudo escritora... posso apenas comunicar-vos que chove lá fora, algo que contemplo pela janela do meu quarto... assim como chove cá dentro, em mim, algo que sinto e vejo pelo brilhar dos meus olhos quando receosa aproximo-me um pouco mais do espelho... preciso apenas de breves instantes para perceber que tenho que virar a cara e fechar os olhos, na certeza de não querer ver a tempestade que vai lá dentro!
oiço as gotículas bater na minha janela, confundo esse tilintar com o que tenho em mim... à noite na escuridão do meu quarto, que em nada se compara com o breu da minha alma, confundo o som da chuva a cair do alto de um céu estrelado com a rebelião que mesmo durante os meus sonhos se apodera de mim!

...é apenas água.

Thursday, January 8, 2009

os dias passam com a leveza natural do seu existir...com as suas 24 horas contadas, os seus minutos termináveis, a sua constância. E como o suposto supremo criador ao sétimo dia descansou assim sinto todos os dias do ano que se apresenta cheio de novas, as mesmas do ano que findou, oportunidades...num descanso quase eterno em todos os meus sétimos dias de cada dia!

Wednesday, December 10, 2008

beijos...

roubei de ti o que tinhas já assaltado... não resisti:

«Toco a tua boca.

Com um dedo, toco a borda da tua boca, desenhando-a como se saísse da minha mão, como se a tua boca se entreabrisse pela primeira vez, e basta-me fechar os olhos para tudo desfazer e começar de novo, faço nascer outra vez a boca que desejo, a boca que a minha mão define e desenha na tua cara, uma boca escolhida entre todas as bocas, escolhida por mim com soberana liberdade para desenhá-la com a minha mão na tua cara e que, por um acaso que não procuro compreender, coincide exactamente com a tua boca, que sorri por baixo da que a minha mão te desenha.

Olhas-me, de perto me olhas, cada vez mais de perto, e então brincamos aos ciclopes, olhando-nos cada vez mais de perto. Os olhos agigantam-se, aproximam-se entre si, sobrepõem-se, e os ciclopes olham-se, respirando confundidos, as bocas encontram-se e lutam sem vontade, mordendo-se com os lábios, quase não apoiando a língua nos dentes, brincando nos seus espaços onde um ar pesado vai e vem com um perfume velho e um silêncio. Então as minhas mãos tentam fundir-se no teu cabelo, acariciar lentamente as profundezas do teu cabelo enquanto nos beijamos como se tivéssemos a boca cheia de flores ou de peixes, de movimentos vivos, de uma fragrância obscura. E se nos mordemos a dor é doce, e se nos afogamos num breve e terrível absorver simultâneo do fôlego, essa morte instantânea é bela. E há apenas uma saliva e apenas um sabor a fruta madura, e eu sinto-te tremer em mim como a lua na água.»

o jogo do mundo
julio córtazar

Monday, December 8, 2008

o novo mundo

tenho dias, momentos em que penso se as escolhas que fazemos serão realmente a melhor opção... naquele instante em que estou prestes a tornar a minha vida diferente, a ir por um caminho que desconheço... olho em frente e não sei o que se encontra para além dos meus pés... e os meus passinhos outrora confiantes deixam o meu corpo balançar e estremecer, contudo tomo balanço, tomo coragem e decido, respiro fundo e convenço-me de que tudo correrá bem. deixo-me sair do meu casulo, parto à aventura sem nunca ousar sequer que ao olhar para trás deixei saudades, incertezas, dúvidas.

as dúvidas, as incertezas e as saudades aparecem como certas e os caminhos pelos quais me decidi ficam ainda mais turvos que da primeira vez.

os amigos, os sorrisos e abraços que deixei deliberadamente para trás outrora cheia de incertas certezas e fantasias invadem os meus sonhos e assim permaneço parada a divagar num futuro que poderia ter sido diferente, tivesse eu me deixado ficar quietinha sem grandes mudanças, sem a possibilidade de me desiludir se por acaso o chão me falhasse.

dizem-me com experiência que só nos arrependemos do que não fizemos, que olhar para trás à procura de soluções, de respostas, de um "e se eu tivesse feito..."...

será que também nos arrependemos do que fazemos... do que um dia nos lembramos de arriscar e mudar...
perguntas que não quero ver respondidas...

sonhos que partiram, viagens, saudades que ficam...


mia*

Tuesday, December 2, 2008

Luz

não gosto de luz...
com ela vêm uma infinidade de certezas, com ela tudo fica mais claro, as verdades vêem-se melhor.

e assim me deixo permanecer neste vazio de escuridão, fecho as cortinas não quero saber que um novo dia já nasceu, a esperança do que contemplarei há muito me abandonou... a luz não me deixa continuar a mentir-me. os novos dias trazem as mesmas realidades, os mesmos dolorosos sentimentos, nada mudou..
de noite a luz fosca da lua deixa enublados os meus sentidos, perco a clareza no que vejo deixo que a esperança me continue a alimentar...

o brilho do sol ofusca-me, atordoa-me, magoa, fico feliz quando sinto o seu calor no meu pescoço, deixo que me aqueça, fecho os olhos, a vontade de ver desaparece, desejo que chegue a noite para que as minhas lágrimas não se vejam, para que o som do meu soluçar desapareça baixinho por entre os silêncios.

quero sentir o calor do teu abraço...